quinta-feira, 24 de setembro de 2009

O Histórico do Fumo

 



O ato hoje casual de acender um cigarro e sorver a fumaça tem sua origem perdida no tempo. É praticamente impossível determinar como e quando alguém teve pela primeira vez a idéia de acender e aspirar a fumaça das folhas secas do tabaco, planta originária dos Andes. O tabaco acompanhou as migrações dos índios por toda a América Central, até chegar ao território brasileiro. Mas certamente a propagação mundial deste comportamento confunde-se com a história do chamado Novo Mundo: a vasta extensão de terras recém-descobertas que Cristóvão Colombo descobriu em 1492.

Muito antes dos europeus pisarem este lado do planeta, o fumo fazia parte do cotidiano dos nativos da América, e sua função estava muito mais relacionada aos sistemas de crenças destes povos do que ao prazer puro e simples do consumo. No Brasil, na época do Descobrimento, o fumo fazia parte dos rituais dos índios de todas as tribos que entraram em contato com os portugueses: como se observou mais tarde - e os relatos dos marujos de Pedro Álvares Cabral confirmaram - a fumaça obtida a partir da queima das folhas era considerada a materialização milagrosa do hálito dos pajés.

A novidade foi motivo de comentários nas cortes européias. Além dos hábitos incomuns - como andar sem roupas, pintar a pele e lavar o corpo com grande freqüência - as gentes da América também aspiravam fumaça... Uma novidade difícil de acreditar, por mais que diversos relatos, como o de Gabriel Soares de Souza, tentassem explicar a atividade da forma mais didática possível: "vimos que alguns nativos demonstravam grande aplicação em sorver a fumaça das folhas queimadas para dentro, até que lhes saísse pelas ventas".



Por sua aura de delícia e magia, e suas propriedades consideradas curativas, o fumo imediatamente chamou a atenção dos conquistadores. Em 1518, o missionário espanhol Romano Pane enviou ao Imperador Carlos V um punhado de sementes de tabaco que foram cultivadas por Sua Alteza com todo o cuidado, daí resultando a primeira plantação européia. Bem antes disso, porém, alguns marinheiros da esquadra de Cabral já tinham levado para o mar os seus pedaços de fumo. Muitos o usavam para pulverizar o pó sobre as feridas, já que os índios reconheciam o poder do tabaco como cicatrizante. Mas a grande maioria preferia fumá-lo, para diminuir o tédio e a melancolia das horas lentas do mar, por destinos que podiam levar um homem a ficar longe de casa por meses ou anos.

A expansão mundial do uso se deve, sem sombra de dúvida, à interação de Portugal com sua colônia, o Brasil. Por volta de 1550, causavam furor na corte de Lisboa as descrições do poder curativo da planta trazida da colônia por Luís de Góis, um donatário que viera ao Brasil em 1530, na expedição de Martin Afonso de Souza. Após 12 anos explorando as particularidades da nova terra, Góis voltou para casa levando na bagagem as sementes do tabaco. Por suas propriedades medicinais e aspecto exótico, o vegetal foi imediatamente plantado nos jardins da Infanta D. Maria, e a mística em torno de suas qualidades começou. Logo o "mistério dos feiticeiros d'além-mar" passou a ser chamado de "Erva Santa", ou "Erva-das-Índias", capaz de curar dores de cabeça, males do estômago e as temidas manifestações do Noli me Tangere, ou úlceras cancerosas.

O capítulo que a introdução do fumo ocupa na história da farmacologia é dos mais interessantes. Provando que a tendência a acreditar em curas milagrosas é bastante antiga , tão logo o tabaco foi introduzido em Portugal transformou-se num sucesso . Incomodados com a existência de um medicamento natural tão poderoso, mas que escapava totalmente à descrição de suas minuciosas anotações, grupos de "físicos" (os médicos da época) optaram por uma estratégia científica pouco ortodoxa. Puseram-se a escrever tratados sobre o fumo mesmo sem jamais terem visto uma folha!

Foi assim que, rapidamente, surgiu toda uma "literatura médica" empenhada em provar que a "Erva Santa", em diversas proporções e combinações, podia curar nevralgias, gengivites, fístulas, pústulas, dores de dentes, bicheiras e outras doenças de animais e doenças de pele entre outros males. Naturalmente, várias vozes se levantaram contra a tendência de transformar toda a farmácia da época em uma "botica de uma droga só" - e a calorosa discussão entre tabagistas e antitabagistas, que já dura cinco séculos, começou.

Não sabemos até onde estes eminentes debates influenciaram o embaixador francês na corte portuguesa, Jean Nicot. Mas sem dúvida alguma foi dele a decisão de mandar uma partida de fumo, com algumas instruções, a sua rainha, Catarina de Médici, esposa de Henrique II, atormentada por crises contínuas de enxaqueca. O fumo chegou às mãos de Sua Majestade em 1559. Imediatamente a rainha começou a cheirar o pó e a pitar pequenos cigarros, sendo seguida por boa parte de sua corte.

A iniciativa de Nicot fez com que, mais tarde, o botânico De la Champ batizasse o tabaco, cientificamente, como Herba Nicotiana, dando o nome do embaixador a todo o gênero de plantas ao qual o fumo pertence.

A primazia de Nicot como divulgador do tabaco gerou, no mínimo, uma crise de ciúmes, que acabou legando aos brasileiros, em conseqüência, um dos mais interessantes relatos sobre a invasão francesa ao Brasil, em 1550. O Padre Andre Thevet, que acompanhou Villegaignon em suas caravelas, não hesitou em escrever um livro para provar que era ele, e não o diplomata de Sua Majestade, o responsável pela chegada do tabaco à França. Verdade ou não, o fato é que o tabaco entrou na França, na Espanha e em Portugal na década de 1550, mas demorou mais quinze anos para apresentar-se no Reino Unido. Ou seja: os ingleses só tiveram contato com o tabaco a partir de 1565.

Nesta época, a Espanha já estava popularizando o rapé, que logo se tornou moda nos salões: o pó finíssimo das folhas torradas e moídas era servido em ricas caixinhas de metal e porcelana, trabalhadas com ouro e pedras preciosas. É também neste mesmo período que o cachimbo se incorpora à imagem típica do inglês. A origem do cachimbo é curiosa: surgiu da adaptação do objeto tradicionalmente usado pelos índios norte-americanos, que aspiravam a fumaça pelo nariz a partir de exóticos tubos em forma de Y. Da Virgínia, colônia britânica que, mais tarde, faria parte dos EUA, Sir Walther Raleigh levou a moda para a Inglaterra. E logo passou a plantar o fumo, juntamente com a batata, nas vastas extensões de terra que foram designadas pela Coroa para este fim.

Respaldado na aceitação dos poderosos e viajando nos bolsos dos marinheiros que atravessavam o globo, o fumo espalhou-se. Das algibeiras inglesas, o cachimbo e a bolsa de tabaco saltaram para a Holanda, a Alemanha, a Rússia e invadiram toda a Ásia, via Balcãs. O hábito passou dos moscovitas aos tártaros orientais, atingiu a África, a Ásia Menor, a Grécia, a Hungria, a Polônia e, em seqüência, todos demais reinos do Norte.

E Portugal? Após anos de experiências, os portugueses desenvolveram uma tecnologia própria para a confecção de cigarros e charutos primitivos, que passaram a acompanhá-los em suas viagens de expansão. Foi por esta via que o tabaco chegou às Filipinas, em seguida ao Japão, e por fim, à China. Pela mesma época, a Itália o descobre pelas mãos do Cardeal Tornabona, que ensina seu cultivo ao Rei das duas Sicílias. Em meados do século XVII, o mundo inteiro fumava. E a Companhia Holandesa das Índias Ocidentais tratou de dar novos mercados ao interessante negócio. Com sua longa experiência em monopólios, a poderosa Companhia organizou as rotas para que a Europa passasse a receber fumo principalmente a partir da Holanda, que o importava da América - em particular da Virgínia, Antilhas e Brasil, onde estavam as maiores plantações - redistribuindo-os depois, de acordo com seus interesses econômicos. É por este motivo que a Alemanha, por exemplo, durante muito tempo só pôde abastecer os seus cachimbos com o fumo proveniente da Virgínia, mas despachado via Amsterdã.

Não demorou muito para que as nações envolvidas com o consumo e a produção de fumo descobrissem que ele estava se tornando um negócio muito lucrativo, capaz de pesar decisivamente na balança comercial dos países produtores e distribuidores. Calcula-se que o tabaco brasileiro, na época, rendeu nada menos que 2 milhões de libras esterlinas, levando Antonil, importante observador econômico do Brasil Colônia, a escrever: "É já, (o fumo), depois das alfândegas, a principal receita do Estado. As décimas não receberam mais que 174 contos e 350 o imposto de cisas; em nenhum ano deram mais à Coroa as minas de ouro e dos diamantes do Brasil."

Controlado e tributado desde cedo no Brasil, o fumo e seus derivados só passaram a sofrer a interferência direta do Estado pelo mundo afora no auge do período napoleônico, graças a um episódio casual. Conta-se que, em sua festa de casamento com Maria Luíza, Napoleão ficou impressionado com a exuberância dos trajes e jóias de uma senhora desconhecida que, no salão, ofuscava até mesmo a rainha. Perguntou quem era, e recebeu a resposta surpreendente: não era uma nobre, mas uma burguesa, esposa de um riquíssimo fabricante de cigarros!

O Imperador - que era não apenas um excelente estrategista, mas também um administrador preocupado com a solidez do seu tesouro - considerou que uma fonte tão espetacular de lucro não poderia ficar abandonada apenas nas mãos de particulares. E o resultado da ostentação da bela senhora foi que, pouco depois, o monopólio da comercialização de tabaco em toda a França passou para as mãos do Estado.

Até os últimos anos do século XVI, os colonos portugueses obtiveram fumo pelo escambo, sistema de trocas que beneficiava muito mais o colonizador que os índios. Percebendo que estavam perdendo a terra, as riquezas que existiam nela e a própria liberdade, os índios não tardaram a reagir. Começava aí o longo ciclo de guerras que marcou de forma dramática as primeiras páginas da História do Brasil, e que tiveram influência direta na produção de fumo.

As primeiras lavouras de tabaco formadas pelos colonos surgiram da necessidade de garantir o consumo próprio. Como as "escaramuças" entre flechas e canhões nunca tinham data certa para começar - nem para acabar - era preciso plantar o próprio fumo ou esquecer o cigarro, pois os índios, até então os únicos produtores, nem sempre estavam dispostos a colaborar. Logo, porém, muita gente apareceu disposta a comprar o excedente: afinal, na Europa a procura crescia, e vários negociantes começavam a vislumbrar as grandes possibilidades de lucro que surgiriam a partir da criação de uma via regular de abastecimento.

Enquanto a cana-de-açúcar era plantada em larga escala, o fumo ocupava áreas reduzidas, concentradas entre Salvador e Recife, sobretudo nos arredores de Cachoeira, no Recôncavo Baiano. A produção era basicamente doméstica. Apenas a partir do final do século XVII surgiram produtores com maior capacidade, que passaram a empregar mão-de-obra escrava. Até então, como a atividade não ocupava os doze meses do ano, quase todos os produtores eram também senhores de engenho e criadores de gado, que afirmavam que "faziam algum fumo" como complemento da renda familiar.

Na primeira metade do século XVII, durante a ocupação holandesa em Pernambuco, o fumo produzido naquela Capitania ocupou papel importante na carteira comercial de produtos oferecidos pela Companhia das Índias Ocidentais. Com o estabelecimento definitivo da primazia portuguesa na colônia, começaram a aparecer as primeiras legislações reguladoras da atividade produtiva. Em 1674, o monopólio da metrópole foi garantido, através da criação da Junta de Administração do Tabaco, cujas determinações estabeleceram as "regras do jogo" não apenas para o Brasil, mas para todas as colônias portuguesas. O surgimento da Junta significou também o início de uma pesada tributação sobre o fumo (dízimos, taxas aduaneiras, donativos, direitos locais), que vigoraram principalmente na Bahia e em Pernambuco, já que no Rio de Janeiro a cultura foi proibida e todo o comércio dado a um particular.

De 1690 a 1730, uma legislação especial tentou regular o comércio a partir do controle das cargas transportadas. As vastas extensões do território e a diversidade de áreas produtivas fez com que a norma não obtivesse muito sucesso. Somente em 1751, sob a mão firme do Marquês de Pombal, foram criados novos regulamentos e órgãos especiais como a Mesa de Inspeção do Tabaco. A partir desta data a legislação enfim se estabilizou e vigorou até depois da Independência.

Nesta época, o fumo brasileiro passou a ter três destinos principais. O produto de primeira e segunda qualidades era exportado para Lisboa. De lá, cerca de 60% era comercializado para a Europa – Portugal, e ilhas adjacentes consumiam o restante. O fumo de terceira qualidade tomou um destino até então inexplorado: o tráfico de escravos africanos.

Foi a partir desta época que o fumo baiano virou a principal moeda nas transações que envolveram compra e venda de escravos, especialmente na Costa da Mina e, em menor escala, em outras regiões da África, como Angola e Moçambique. As lavouras de fumo cresciam, para atender às necessidades de um sistema de produção que dependia mais e mais do braço escravo, privilegiando a sede de lucros da metrópole. A necessidade era tanta que Lisboa, que normalmente controlava com vigor todo e qualquer produto das colônias, inúmeras vezes simplesmente desprezou os excessos de produção das lavouras de tabaco da Bahia. Por fim, estas acabaram por se desenvolver com maior autonomia que qualquer outra atividade produtiva no Brasil colônia. Embora as quantidades para exportação fossem controladas (apenas 200 toneladas por ano na primeira metade do século XVII) e a qualidade determinada (só o fumo de terceira qualidade era enviado à África), a verdade é que o intercâmbio entre a Bahia e a Costa da Mina representou nada menos que 30% das exportações de fumo do Brasil, durante o período colonial. Esta relação durou até o fim do tráfico, no século XIX, e está na origem da riqueza de vários comerciantes baianos.

Com a extinção do tráfico negreiro, o fumo baiano teve que buscar outras direções. Mas o comércio não chegou a ser afetado: a produção destinada à Costa da Mina foi redirecionada para a Europa e o mercado interno, com vantagens. Ao final do século XIX, o fumo já havia se consolidado como um elemento fundamental na formação econômica e social do país.

No período colonial, o Brasil, como todas as possessões portuguesas, estava terminantemente proibido de ter fábricas em seu território. Condenado à produção da matéria-prima - e a consumir produtos manufaturados da metrópole - o país teve que aguardar até 1808 pela chegada da Corte Portuguesa ao Rio de Janeiro, antes de pensar em uma indústria nacional. O alvará de D. João VI que tratava do tema abriu caminho para o início do desenvolvimento do setor. E as primeiras fábricas foram as de rapé.

As primeiras fábricas de rapé brasileiras de que se tem notícia foram as de Caetano Januário (1817) e Pedro José Bernardes (1818), no Rio de Janeiro. Em 1819, o suíço Frederic Meuron funda a fábrica de Area Preta, na Bahia, que mais tarde criaria sucursais em Andarahy Pequeno (Rio, 1832) e em Chora Menino (Pernambuco, 1836). Em 1833, mais duas fábricas apareceram na Bahia, inclusive a que produzia o famoso rapé Princesa de Lisboa, no bairro Nazaré. Em 1850, o Rio era o grande produtor de rapé do país, com cinco fábricas, entre elas a de João Paulo Cordeiro, cujo prédio seria comprado, mais tarde, pela Souza Cruz.

A fábrica de João Paulo Cordeiro era a mais importante do território fluminense, com produção de 100 mil libras e faturamento anual de 100 mil réis. Empregava 53 operários (49 escravos) e era a concorrente direta da fábrica de Meuron, que na Bahia produzia 165 mil libras anuais de rapé, com apenas 24 operários (18 escravos e 6 estrangeiros). Juntas, as cinco fábricas do Rio lançavam anualmente no mercado 347 mil libras de rapé, empregando 110 operários (98 escravos, 11 estrangeiros e 1 brasileiro). Mas a florescente indústria logo entrou em decadência. E o responsável foi aquele que se transformaria na mais nova vedete dos salões: o charuto.

Símbolo de sofisticação e bom gosto, o charuto ganhou os salões no final do século XIX e permaneceu soberano durante toda a República Velha. Ligado a uma aura de masculinidade e modernidade, seu surgimento logo dividiu os adeptos do fumo em tabaquistas (consumidores de rapé) e fumistas (apreciadores de charutos). Nas ruas e saraus da época, um e outro propagava a preponderância de sua opção e de suas idéias. Como o rapé significava "o velho", e o charuto, "o novo" (e não podemos esquecer que o século XX era, então, o novíssimo século), o charuto venceu, e o rapé desapareceu. Tudo isso, sem dúvida, contribuiu para tornar o ato de fumar charuto um verdadeiro ritual, que até hoje conta com inúmeros adeptos.

Por ser inteiramente artesanal, a indústria de charutos sempre teve características muito especiais. Não havia necessidade de maquinaria, prédios especiais, nem pessoal muito numeroso. A fabricação era caseira: com freqüência, as próprias famílias dos lavradores produziam os charutos à noite, depois do trabalho na roça. A facilidade da produção doméstica deu surgimento às primeiras cooperativas de produtores. Em 1842, os alemães de São Leopoldo do Sul (RS), uniram-se para comercializar sua produção que chegava a 21,2 mil unidades mensais, com lucros de até 800 mil réis.

Mesmo assim, começaram a surgir pequenas fábricas, cerca de 300, espalhadas pelo país, com média de apenas 5 funcionários em cada uma. Foi na Bahia, em 1851, que surgiram duas das principais manufaturas cujos produtos marcaram época: a de Costa Ferreira & Penna, e a de Viera de Melo. A partir de 1870, nomes como Danneman, Suerdieck, Pimentel e Companhia de Charutos Poock começaram também a fixar suas marcas no mercado. Quase totalmente consumida no país, a produção charuteira chegava aos 40 milhões de unidades/ano em meados do século XIX, subindo para 60 ou 70 milhões no fim do século.

Não que ele fosse desconhecido: afinal, o hábito de desfiar o fumo de corda e colocar dentro de uma palha para enrolar os cigarros viajou nas caravelas, com os portugueses.. Mas a transformação do cigarro em indústria altamente produtiva, no Brasil, é um fenômeno do século XX. Antes disso, os poucos cigarros industrializados disponíveis eram importados, e consequentemente, muito caros: além do valor da exportação, havia a questão dos impostos. O surgimento da indústria nacional cigarreira contribuiu para a queda do consumo do charuto.

Em 1874, o português José Francisco Correia estabeleceu um pequeno negócio de fumo na Rua Sete de Setembro, centro do Rio de Janeiro, com capital inicial de apenas 100 mil réis. Dois anos depois, a fábrica ampliou-se, já com o nome de Imperial Estabelecimento de Fumo, responsável pela produção do famoso fumo Veado. Mais tarde, a fábrica foi transferida para Niterói e permaneceu vários anos como uma das primeiras do mercado nacional. Foi nela que um outro português deu seus primeiros passos na indústria de fumo: o jovem Albino Souza Cruz, que mais tarde fundaria sua própria empresa.

Em 1880, outra grande manufatura de fumo surgiu em Pelotas (RS). Sua marca Cerrito permaneceu no mercado e, em 1912, obteve prêmios de qualidade não apenas em Porto Alegre mas também no Rio de Janeiro, Turim e Milão.

O século XX trouxe pleno vigor para a indústria cigarreira, que passou a dividir suas atividades em dois tipos de fábricas: as que desfiavam o fumo e as que o beneficiavam para exportação. Estas fábricas, ligadas à companhias exportadoras, trabalhavam para atender às exigências específicas do mercado externo: folhas finas e sedosas para a Áustria; bem secas, destaladas, castanhas ou avermelhadas para a Inglaterra; muito claras, elásticas e resistentes, para a Alemanha. As fábricas desenvolveram-se principalmente em São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, embora alguns estados que produziam pequenas quantidades de fumo tenham lançado também suas marcas no mercado, a partir do fumo já processado. É o caso do Ceará, Sergipe e Maranhão, que no ano de 1900 produziram, respectivamente, 3,5 milhões, 200 mil e 35 mil unidades de cigarros, rapidamente absorvidas pelos seus mercados internos.

Atualmente, com a modernização de maquinário da indústria e grande facilidade de obtenção de matéria-prima, a indústria de cigarros no Brasil vem mantendo uma posição entre os maiores produtores.



A atual estrutura da lavoura, indústria e comércio de fumo surgiram da concentração ocorrida entre 1910 e 1930, conseqüência direta dos movimentos de diversificação da produção acontecidos no século XIX.

Com o final da liberdade vigiada que Portugal impôs ao Brasil durante o período colonial, as lavouras de fumo entraram numa fase de grande expansão. Tornou-se possível cultivar qualquer espécie, em qualquer lugar. Além disso, a possibilidade do comércio direto com países estrangeiros representou um grande incentivo. Nesta arrancada, que começa efetivamente a partir de 1850, as províncias que se destacaram foram as de Goiás, Minas Gerais, Bahia e, por um fenômeno especial ligado à vinda dos imigrantes alemães, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Em São Paulo, a cultura foi favorecida pelo aumento populacional motivado pela chegada de milhares de imigrantes que vieram trabalhar nas fazendas de café. Mas o estado nunca foi auto-suficiente no setor, e sempre dependeu do fumo de outros locais para atender sua crescente demanda.

Foi também nesta época que o fumo goiano passou a ser apreciado em todo o Brasil e no exterior. Tido como uma variedade típica, com sabor característico e único no mundo, o fumo de Goiás conquistou o primeiro prêmio na Exposição de Filadélfia - EUA, em 1875.

No século XX, a produção se dividiu em duas vertentes bastante específicas. Enquanto a Bahia conservava sua cultura tradicional de fumos escuros para charuto e folha, o Rio Grande do Sul especializava-se nos fumos claros, principais componentes dos cigarros, cuja indústria estava em expansão. Foi a partir desta fase que a produção no Sul do país começou de fato a se consolidar. Entre 1920 e 1925, a Bahia e o Rio Grande do Sul, juntos, representavam 52,27% da produção nacional. Nos cinco anos seguintes, passaram a responder por 79,93%. Em 1930, a produção dos dois estados quase se igualava: 39, 9 mil toneladas na Bahia (fumos escuros) e 30,34 mil toneladas no Rio Grande do Sul (fumos claros). Surgiu também uma diferença de tecnologia: enquanto a Bahia continuava com a secagem ao sol e em galpões, desde 1920 o Rio Grande do Sul especializou-se na secagem em estufa, melhorando sensivelmente a qualidade de seu produto. Os demais estados produziam apenas fumo de corda.

As grandes fábricas que concentraram a produção fumageira são um fenômeno do século XX. Na Bahia, as pequenas empresas familiares foram desaparecendo aos poucos, dando lugar às fábricas de maior envergadura que começaram a se associar, ocupando fatias cada vez mais expressivas do mercado. Nas primeiras décadas, cinco grandes indústrias dominavam o setor: a Suerdieck & Cia, a Costa Ferreira & Penna; a Stender & Cia; a Viera de Mello e a Dannemann & Cia. Juntas, elas produziram 61,2 milhões de charutos em 1919 - 48% da produção nacional. No ano seguinte, a participação cresceu para 75%.

A necessidade de fortalecimento diante das novas exigências do mercado fizeram com que os conglomerados continuassem a se concentrar. Em 1922, a Dannemann uniu-se à Stender & Cia. Em 1941, a Suerdick & Cia uniu-se à Vieira de Mello. Em 1930, juntamente com a Costa Ferreira & Penna, estas companhias respondiam por quase toda a produção de charutos do país.

O setor cigarreiro também sentiu a necessidade de adaptação. Devido a grande procura no mercado interno, o número de fábricas crescera rapidamente, principalmente no Rio, São Paulo e Rio Grande do Sul. Em 1912, as maiores empresas já resultavam da associação de homens de negócios cujos nomes eram conhecidos no setor, como José Lopes Correia & Cia, Lopes Sá & Cia, Paulino Salgado & Cia, e Souza Cruz & Cia, todas do Rio de Janeiro. Além destas, merecem destaque a Leite & Alves (com fábricas no Rio e na Bahia), a Gonçalves & Guimarães, a maior de São Paulo e a Henning & Cia e a dos irmãos Schultz, ambas no Rio Grande do Sul. Em 1920, estas empresas respondiam por cerca de 80% da produção nacional, que chegava a 300 milhões de maços.

O setor de beneficiamento de fumo em folhas também não escapou ao fenômeno da concentração. O principal exemplo ocorreu em Santa Cruz do Sul, onde em 1918 seis beneficiadoras se uniram para formar a Companhia de Fumos Santa Cruz. Entre seus sócios, estavam os irmãos Schultz, que tinham a maior fábrica de cigarros da região sul e a empresa de Theodoro F. Schilling & Cia, também proprietária de uma fábrica de cigarros. O capital inicial de 500 contos de réis subiu rapidamente para 1, 2 mil e chegou a 2 mil contos em 1926, tornando a companhia a maior beneficiadora de fumo do país.

Ao longo do século XX, a produção da indústria brasileira não parou de crescer, tendo garantido não apenas o abastecimento externo, mas uma vigorosa retomada das exportações. Nos últimos seis anos do século XX, o Brasil alcançou a liderança mundial nas exportações de fumo em folha, conseqüência da alta qualidade e segurança de abastecimento. Os principais compradores são, pela ordem: Alemanha, Reino Unido e Estados Unidos. Em 1999, 305,6 mil toneladas foram enviadas ao mercado externo, movimentando cifras da ordem de US$ 951,2 milhões e respondendo por 1,86% do comércio exportador.



O Crescimento das Exportações de Fumo em Folha do Brasil


Fonte : Perfil ABIFUMO



Fonte da reportagem: SOUZA CRUZ

www.souzacruz.com.br



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